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Judaísmo Brasileiro - Cultura Judaica



PRESENÇA JUDAICA NA LÍNGUA PORTUGUESA
EXPRESSÕES E DIZERES POPULARES EM PORTUGUÊS
DE ORIGEM CRISTÃ-NOVA OU MARRANA
Jane Bichmacher de Glasman (UERJ)
O objetivo do presente trabalho é apresentar alguns exemplos de influência judaica na língua portuguesa, a partir de uma ampla pesquisa sócio-lingüística que venho desenvolvendo há anos. A opção por judaica (e não hebraica) deve-se a uma perspectiva filológica e histórica mais abrangente, englobando dialetos e idiomas judaicos, como o ladino (judeu-espanhol) e o iídiche (alemão), entre os mais conhecidos, além de vocábulos judaicos e expressões hebraicas que passaram a integrar o vernáculo a partir de subterfúgios e/ ou corruptelas, cuja origem remonta à bagagem cultural de colonizadores judeus, cristãos-novos e marranos.
Há uma significativa probabilidade estatística de brasileiros descendentes de ibéricos, principalmente portugueses, terem alguma ancestralidade judaica. A base histórica para tal é a imigração maciça de judeus expulsos da Espanha, em 1492, para Portugal, devido à contigüidade geográfica e às promessas (não cumpridas) do Rei D. Manuel I, que traziam esperança de sua sobrevivência judaica como tal. Mesmo com a expulsão de Portugal em 1497, os judeus (além dos cristãos-novos e dos cripto-judeus ou marranos) chegaram a constituir 20 a 25% da população local.
Sefaradim (de Sefarad, Espanha, da Península Ibérica) procuraram refúgio em países próximos no Mediterrâneo, norte da África, Holanda e nas recém-descobertas terras de além-mar nas Américas, procurando escapar da Inquisição. Até hoje é controversa a origem judaica ou criptojudaica de descobridores e colonizadores do Brasil, para onde imigraram incontáveis cristãos-novos, alternando durante séculos uma vida como judeus assumidos e marranos, praticando o judaísmo secretamente (fora os que permaneceram efetivamente católicos), de acordo com os ventos políticos, sob o domínio holandês ou a atuação da Inquisição, variando de um clima de maior tolerância e liberdade à total intolerância e repressão.
Comparando apenas sob o ponto de vista cronológico, nem sempre lembramos que, enquanto o Holocausto na Segunda Guerra Mundial foi tão devastador, especialmente nos quatro anos de extermínio maciço de judeus, a Inquisição durou séculos, pelo menos três dos cinco da história “oficial” do Brasil, isto é, após o descobrimento. Tantos séculos de medo, denúncias, processos e mortes, geraram, por um lado, um ambiente psicológico de terror para os judeus e cristãos novos no Brasil; por outro, um anti-semitismo evidente ou subliminar que permaneceu arraigado na população, inclusive como autodefesa e proteção.
Uma característica do comportamento de cristãos-novos “suspeitos” foi procurar ser “mais católicos do que os católicos”, buscando sobreviver à intolerância e determinando práticas sócio-culturais e lingüísticas.
A citada alternância entre vidas assumidamente judaicas e marranas, praticando judaísmo em segredo, com costumes variados, unificados pela “camuflagem” de seu teor judaico, gerou comportamentos e aspectos culturais (abrangendo rituais, superstições, ditados populares, etc.) que se arraigaram à cultura nacional. A maioria da população desconhece que muitos costumes e dizeres que fazem parte da cultura brasileira têm sua origem em práticas criptojudaicas. Apresentarei alguns exemplos bem como suas origens e explicações, a partir da origem judaica “marrana”.
“Gente da nação” é uma das denominações para designar marranos, judeus, cristãos-novos e cripto-judeus, embora existam diferenças entre termos e personagens.
Cristãos-novos foi denominação dada aos judeus que se converteram em massa na Península Ibérica nos séculos XIII e XIV; é preconceituosa devido à distinção feita entre os mesmos e os “cristãos-velhos”, concretizado nas leis espanholas discriminatórias de “Limpieza de Sangre” do século XV.
Criptojudeus eram os cristãos-novos que mantiveram secretamente seu judaísmo. Gente da nação era a expressão mais utilizada pela Inquisição e Marranos, como ficaram mais conhecidos. Embora todos fossem descendentes de judeus, só poucos voltaram a sê-lo, e em países e épocas que o permitiram.
O próprio termo “marrano” possui uma etimologia diversificada e antitética. Unterman (1992: 166), conceitua de forma tradicional, como “nome em espanhol para judeus convertidos ao cristianismo que se mantiveram secretamente ligados ao judaísmo. A palavra tem conotação pejorativa” geralmente aplicada a todos os cripto-judeus, particularmente aos de origem ibérica. Em 1391 houve uma maciça conversão forçada de judeus espanhóis, mas a maioria dos convertidos conservou sua fé. Já Cordeiro (1994), com base nas pesquisas de Maeso (1977), afirma que a tradução por “porco” em espanhol tornou-se secundária diante das várias interpretações existentes na histografia do marranismo.
Para o historiador Cecil Roth (1967), marrano, velho termo espanhol que data do início da Idade Média que significa porco, aplicado aos recém-convertidos (a princípio ironicamente devido à aversão judaica à carne de porco), tornou-se um termo geral de repúdio que no século XVI se estendeu e passou a todas as línguas da Europa ocidental.
A designação expressa a profundidade do ódio que o espanhol comum sentia pelos conversos com quem conviviam. Seu uso constante e cotidiano carregado de preconceito turvou o significado original do vocábulo. Em “Santa Inquisição: terror e linguagem”, Lipiner (1977) apresenta as definições: “Marranos: As derivações mais remotas e mais aceitáveis sugerem a origem hebraica ou aramaica do termo. Mumar: converso, apóstata. Da raiz hebraica mumar, acrescida do sufixo castelhano ano derivou a forma composta mumrrano, abreviado: Marrano. Tratar-se-ia, pois de um vocábulo hebraico acomodado às línguas ibéricas. Marit-áyin: aparência, ou seja, cristão apenas na aparência. Mar-anús: homem batizado à força. Mumar-anus: convertido à força. Contração dos dois termos hebraicos, mediante a eliminação da primeira sílaba”. Anus, em hebraico, significa forçado, violentado.
Antes de exemplificar a contribuição lingüística marrana, convém ressaltar que a vinda dos portugueses para o Brasil trouxe consigo todos os empréstimos culturais e lingüísticos que já haviam sido incorporados ao cotidiano ibérico, desde uma época anterior à Inquisição, além de novos hábitos e características; muitas palavras e expressões de origem hebraica foram incorporadas ao léxico da língua portuguesa mesmo antes de os portugueses chegarem ao Brasil. Elas encontram-se tão arraigadas em nosso idioma que muitas vezes têm sua origem confundida como sendo árabe ou grega. Exemplo: a “azeite”, comumente atribuída uma origem árabe por se assemelhar a um grande número de palavras começadas por “al-” (como alface, alfarrábio, etc.), identificadas como sendo de origem árabe por esta partícula corresponder ao artigo nesta língua. O artigo definido hebraico é a partícula “a-” e “azeite” significa, literalmente, em hebraico “a azeitona” (ha-zait).
Apesar da presença judaica por tantos séculos, em Portugal como no Brasil, as perseguições resultaram também em exclusões vocabulares. A maior parte dos hebraísmos chegou ao português por influência da linguagem religiosa, particularmente da Igreja Católica, fazendo escala no grego e no latim eclesiásticos, quase sempre relacionados a conceitos religiosos, exemplos: aleluia, amém, bálsamo, cabala, éden, fariseu, hosana, jubileu, maná, messias, satanás, páscoa, querubim, rabino, sábado, serafim e muitos outros.
Algumas palavras adotaram outros significados, ainda que relacionados à idéia do texto bíblico. Exemplosbabel indicando bagunça; amém passando a qualquer concordância com desejos; aleluia usada como interjeição de alívio.
O preconceito marca palavras originárias do hebraico usadas de forma depreciativa, como: desmazelo (de mazal – negligência, desleixo), malsim (de mashlin – delator, traidor), zote (de zot / subterrâneo, inferior, parte de baixo – pateta, idiota, parvo, tolo), ou tacanho (de katan – que tem pequena estatura, acanhado; pequeno; estúpido, avarento); além de palavras relacionadas a questões financeiras, como cacife, derivada de kessef = dinheiro.
Dezenas de nomes próprios têm origem hebraica bíblica, como: Adão, Abraão, Benjamim, Daniel, Davi, Débora, Elias, Ester, Gabriel, Hiram, Israel, Ismael, Isaque, Jacó, Jeremias, Jesus, João, Joaquim, José, Judite, Josué, Miguel, Natã, Rafael, Raquel, Marta, Maria, Rute, Salomão, Sara, Saul, Simão e tantos outros. Alguns destes, na verdade, são nomes aramaicos, oriundos da Mesopotâmia, como Abraão (Avraham), que se incorporaram ao léxico hebraico no início da formação do povo hebreu.
Podemos citar centenas de nomes e sobrenomes de judaizantes e números de seus dossiês, desde a instalação da Inquisição no Brasil, a partir dos arquivos da Torre do Tombo, em Lisboa, e de livros como Wiznitzer (1966), Carvalho (1982), Falbel (1977), Novinsky (1983), Dines (1990), Cordeiro (1994), etc. Sobrenomes muito comuns, tanto no Brasil como em Portugal, podem ser atribuídos a uma origem sefardita, já que uma das características marcantes das conversões forçadas era a adoção de um novo nome. Muitos conversos adotaram nomes de plantas, animais, profissões, objetos, etc., e estes podem ser encontrados em famílias brasileiras, até hoje, em número tão grande que seria difícil enumerá-los. Exemplos: Alves, Carvalho, Duarte, Fernandes, Gonçalves, Lima, Silva, Silveira, Machado, Paiva, Miranda, Rocha, Santos, etc. Não devemos excluir a possibilidade da existência de outros sobrenomes portugueses de origem judaica.
Porém é importante ressaltar que não se pode afirmar que todo brasileiro cujo sobrenome conste dos processos seja descendente direto de judeus portugueses; para se ter certeza é necessária uma pesquisa profunda da árvore genealógica das famílias.
Há ainda algumas palavras e expressões oriundas do misticismo judaico, tão desenvolvido na idade média. O estudo do Talmud e da Cabalá trouxe também contribuições do aramaico, como a conhecida expressão “abracadabra”, que é tida pela nossa cultura como uma “palavra mágica” (num sentido fabuloso), mas que, na realidade pode ser traduzida como “criarei à medida que falo” (num sentido real e sólido para a cultura judaica).
Algumas palavras também designam práticas judaicas ou formas de encobri-las, especialmente observável nos costumes alimentares. Por exemplo: os judeus são proibidos pelaTorá de comer carne de porco, porque tem os cascos fendidos e não rumina, sendo, portanto, impuro. Para simular o abandono desse princípio e enganar espiões da Inquisição, os cristãos-novos inventaram as alheiras, embutidos à base de carne de vitelo, pato, galinha, peru – e nada de porco. Após algumas horas de defumação já podem ser consumidos. Da mesma forma, peixes “de couro” (sem escamas) não serviam para consumo.
Passando às expressões, apresento alguns exemplos, sua origem e explicação:
– “Ficar a ver navios” – Em 1492 foi determinado que os judeus que não se convertessem teriam de deixar a Espanha até ao fim de julho. Centenas de milhares então se fixaram em Portugal. O casamento do rei D. Manuel com D. Isabel, filha dos Reis Católicos, levou-o a aceitar a exigência espanhola de expulsar todos os judeus residentes em Portugal que não se convertessem ao catolicismo, num prazo que ia de Janeiro a Outubro de 1497. O rei Dom Manuel precisava dos judeus portugueses, pois eram toda a classe média e toda a mão-de-obra, além da influência intelectual. Se Portugal os expulsasse logo como fez a Espanha, o país passaria por uma crise terrível. Na realidade D. Manuel não tinha qualquer interesse em expulsar esta comunidade, que então constituía um destacado elemento de progresso nos setores da economia e das profissões liberais. A sua esperança era que, retendo os judeus no país, os seus descendentes pudessem eventualmente, como cristãos, atingir um maior grau de aculturação. Para obter os seus fins lançou mão de medidas extremamente drásticas, como ter ordenado que os filhos menores de 14 anos fossem tirados aos pais a fim de serem convertidos. Então fingiu marcar uma data de expulsão na Páscoa. Quando chegou a data do embarque dos que se recusavam a aceitar o catolicismo, alegou que não havia navios suficientes para os levar e determinou um batismo em massa dos que se tinham concentrado em Lisboa à espera de transporte para outros países. No dia marcado, estavam todos os judeus no porto esperando os navios que não vieram. Todos foram convertidos e batizados à força, em pé. Daí a expressão: “ficaram a ver navios”. O rei então declarou: não há mais judeus em Portugal, são todos cristãos (cristãos-novos). Muitos foram arrastados até a pia batismal pelas barbas ou pelos cabelos.
– “Pensar na morte da bezerra”: frase tão comumente dita por sertanejos quando querem referir-se a alguém que está meditando com ares de preocupação: “está pensando na morte da bezerra”. Registram as denunciações e as confissões feitas ao Santo Oficio, a noção popular, naquele distante período, do que seria o livro fundamental do judaísmo: a Torá. De Torá veio Toura e depois, bezerra, havendo inclusive quem afirmasse ter visto em cara de alguns cristãos-novos, o citado objeto, com chifres e tudo.
– “Passar a mão na cabeça”, com o sentido de perdoar ou acobertar erro cometido por algum protegido, é memória da maneira judaica de abençoar de cristãos-novos, passando a mão pela cabeça e descendo pela face, enquanto pronunciava a bênção.
– Seridó, região no Rio Grande do Norte, tem seu nome originário da forma hebraica contraída: Refúgio dele. Porém, não é o que escreve Luís da Câmara Cascudo, indicando uma origem indígena do nome da região, de “ceri-toh”. Em hebraico, a palavra Sarid significa sobrevivente. Acrescentando-se o sufixo ó, temos a tradução sobrevivente dele. A variação Serid, “o que escapou”, pode ser traduzido também por refúgio. Desse modo, a tradução para o nome seridó seria refúgio dele ou seus sobreviventes.
– Passar mel na boca: quando da circuncisão, o rabino passa mel na boca da criança para evitar o choro. Daí a origem da expressão: “Passar mel na boca de fulano”.
– Para o santo: o hábito sertanejo de, antes de beber, derramar uma parte do cálice, tem raízes no rito hebraico milenar de reservar, na festa de Pessach (Páscoa), um copo de vinho para o profeta Elias (representando o Messias que virá, anunciado pelo Profeta Elias).
– “Que massada!” –usada para se referir a uma tragédia ou contra-tempo, é uma alusão à fortaleza de Massada na região do Mar Morto, Israel, reduto de Zelotes, onde permaneceram anos resistindo às forças romanas após a destruição do Templo em 70 d.C., culminando com um suicídio coletivo para não se renderem, de acordo com relato do historiador Flávio Josefo.
– “Pagar siza” significando pagar imposto vem do hebraico e do aramaico (mas = imposto, em hebraico de misa, em aramaico).
– “Vestir a carapuça” ou “a carapuça serve para ...” vem da Idade Média inquisitorial, quando judeus eram obrigados a usar chapéus pontudos (ou com três pontas) para serem identificados.
– “Fazer mesuras” origina-se na reverência à Mezuzá (pergaminho com versículos de DT.6, 4-9 e 11,13-21, afixado, dentro de caixas variadas, no batente direito das portas).
– "Deus te crie" após o espirro de alguém é uma herança judaica da frase Hayim Tovim, que pode ser traduzido como tenha uma boa vida.
– “Pedir a bênção” aos pais, ao sair e chegar em casa, é prática judaica que remonta à benção sacerdotal bíblica, com a qual pais abençoam os filhos, como no Shabat e no Ano Novo.
– “Entrar e sair pela mesma porta traz felicidade” bem como o costume de varrer a casa da porta para dentro, costume arraigado até os dias de hoje, para “não jogar a sorte fora” é uma camuflagem do respeito pela Mezuzá, afixada nos portais de entrada, bem como aos dias de faxina obrigatória religiosa judaica, como antes do Shabat(Sábado, dia santo de descanso semanal) e de Pessach.
– “Apontar estrelas faz crescer verrugas nos dedos” era a superstição que se contava às crianças para não serem vistas contando estrelas em público e denunciadas à Inquisição, pois o dia judaico começa no anoitecer do dia anterior, ao despontar das primeiras estrelas, dado necessário para identificar o início do Shabat e dos feriados judaicos.
Para concluir, gostaria de mencionar um tema polêmico decorrente deste intercâmbio cultural-religioso: sua influência no português, em vocábulos que adquiriram uma conotação pejorativa e negativa. Os mais discutidos são: judeu, significando usurário, o verbo judiar (e o substantivo judiação) com o sentido de maltratar, torturar, atormentar. Seja sua origem a prática de “judaizar” (cristãos-novos mantendo judaísmo em segredo e/ ou divulgando-o a outros), seja como referência ao maltrato e às perseguições sofridas pelos judeus durante a Inquisição, o fato é que, sem dúvidas, sua conotação é negativa, e cabe a nós estudiosos do assunto e vítimas do preconceito, esclarecer a população e a mídia, alertando e visando à erradicação deste uso, não só pelo desgastado “politicamente correto”, que leva a certos exageros, mas para uma conscientização do eco subliminar de um longo passado recente, Pelo qual não basta o pedido de perdão, se não conduzir a uma mudança no comportamento social.
Referências Bibliográficas
CARVALHO, Flávio Mendes de. Raízes judaicas no Brasil. São Paulo: Arcádia, 1982.
CORDEIRO, Hélio Daniel. Os marranos e a diáspora sefaradita. São Paulo: Israel, 1994.
DINES, Alberto. Vínculos do fogo. São Paulo: Cia. das Letras. 1990.
FALBEL, Nachman & GUINSBURG, Jacó. (org.) Os marranos. São Paulo: CEJ; USP, 1977.
GONSALVES DE MELLO, José Antonio. Gente da Nação InRevista do Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano. 1979.
HOLANDA FERREIRA, Aurélio Buarque de. Novo dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
HOUAISS, Antonio. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
LIPINER, Elias. Santa inquisição: Terror e linguagem. Rio de Janeiro. Documentário, 1977.
MAESO, David Gonzalo. A respeito da etimologia do vocábulo ‘marrano’. São Paulo, CEJ, 1977.
NOVINSKY, Anita. A inquisição. São Paulo: Brasiliense, 1983.
ROTH, Cecil (ed.) Enciclopédia judaica. Rio de Janeiro. Tradição, 1967.
UNTERMAN, Alan. Dicionário judaico de lendas e tradições. Rio de Janeiro: Zahar, 1992.
WIZNITZER, Arnold. Os judeus no Brasil Colonial. São Paulo: Pioneira, 1966.


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A chegada dos Cristãos-Novos e Marranos ao BrasilImprimirE-mail
A Chegada dos Cristãos-Novos e Marranos ao Brasil
Por Marcelo M. Guimarães (*)
Na própria expedição de Pedro Álvares Cabral já aparecem alguns judeus, dentre eles, Gaspar Lemos, (seu nome antes da conversão era Elias Lipner),Capitão-mor, que gozava de grande prestígio com o Rei D. Manuel. Podemos imaginar que tamanha alegria regressou Gaspar Lemos a Portugal, levando consigo esta boa nova: - descobria-se um paraíso, uma terra cheia de rios e montanhas, fauna e flora jamais vistos. Teria pensado consigo: não seria ela uma “terra escolhida” para meus irmãos hebreus? Esta imaginação começou a tornar-se realidade quando o judeu Fernando de Noronha, primeiro arrendatário do Brasil, demanda trazer um grande número de mão de obra para explorar seiscentas milhas da costa, construindo e guarnecendo fortalezas na obrigação de pagar uma taxa de arrendamento à coroa portuguesa a partir do terceiro ano. Assim, milhares e milhares de judeus fugindo da chamada “Santa Inquisição” e das perseguições do “Santo Ofício” de Roma, começaram a colonizar este país.
Afinal, os judeus ibéricos, como qualquer outro judeu da diáspora, procuravam um lugar tranqüilo e seguro para ali se estabelecer, trabalhar, e criar sua família dignamente.

É interessante notar os sobrenomes dos capitães da Armada de Pedro Álvares Cabral:
Pedro ÁLVARES Cabral
Pedro de ATAÍDE
Nuno Leitão da CUNHA
Sancho de TOVAR
Simão de MIRANDA
Nicolau COELHO
Bartolomeu DIAS
Luiz PIRES
Aires GOMES DA SILVA
Simão de PINHA
Diogo DIAS
Gaspar LEMOS
Vasco de ATAÍDE
Uma observação importante é que dos treze sobrenomes citados acima, onze foram adotados pelos cristãos-novos. Seria isto uma coincidência? Ou uma clara evidência de fuga daqueles que aproveitaram a situação para deixarem Portugal, fugindo das regras inquisitórias?
FERNANDO DE NORONHA
Em maio de de 1501, um ano depois do descobrimento, o Rei de Portugal mandou um expedição composta de três embarcações para a terra recém-descoberta, com o propósito de determinar e avaliar a qualidade e a extensão do novo território. O comandante desta expedição foi o florentino Américo Vespucci, que desembarcou no Cais de São Roque.
A Bahia foi descoberta em 1º de novembro de 1501; o Rio de Janeiro em 1º de janeiro de 1502. Relatou Américo Vespucci que o Brasil não possuía metais, pedras preciosas, excetuando-se o “o pau-brasil” e papagaios. Esta informação para D. Manuel deu um duro golpe de desesperança, pois o mesmo estava atrás de especiarias, ouro e prata para o reino. Assim, ele resolveu arrendar o Brasil a homens de negócios, que arriscariam o seu próprio dinheiro na colonização e exploração da nova terra. Ninguém sabe ao certo se Américo Vespucci, amigos dos judeus portugueses ou não, transmitiu ao Rei D. Manuel informações corretas sobre a descoberta da nova terra. Mas, uma coisa pode-se comprovar, havia nesta época muitos judeus ricos e “amigos” do Rei de Portugal.

A primeira concessão foi obtida por um consórcio, ou associação, de cristãos-novos, encabeçado por Fernando de Loronha, citado nos documentos italianos como Firnando dalla Rogna, mais tarde, Noronha, adotou nome de seus padrinhos de batismo.

Durante o primeiro ano, os bens exportado do Brasil eram isentos de taxas; mas no segundo e no terceiro ano, o comércio pagaria à Coroa Portuguesa , respectivamente, 1/6 e ¼ do valor dos bens. Para D. Manuel foi um ótimo negócio. Fernando de Noronha realizou várias expedições para o Brasil, e como gozava de prestígio na Corte Portuguesa, dava-se preferências aos judeus cristãos-novos, principalmente, para aqueles que tinham dinheiro e participavam do consórcio ou mesmo, aqueles mais pobres que viriam para dar sua mão-de-obra. Seja como for, era uma excelente saída para escapar de Portugal e se livrar de perseguições inquisitórias.

O informe de Lunardo revela que o grupo de Noronha foi o pioneiro da indústria de exportação de madeira brasileira, do que auferiu um lucro líquido anual cerca de cinquenta mil ducados. A madeira foi a primeira grande indústria do Brasil.

A INTRODUÇÃO DA INDÚSTRIA DA CANA DE AÇÚCAR

Não há dúvida de que o grupo de Noronha introduziu no Brasil a cana de açúcar proveniente da Ilha da madeira e São Tomé. Em 1516, a Coroa Portuguesa julgou necessária a construção de engenhos de açúcar; a colonização do Brasil se transformava em indústria lucrativa. No mesmo ano D. Manuel mandou estabelecer no Brasil o primeiro engenho. Muitos judeus se tornaram senhores de engenho em Pernambuco.

Um documento datado de 1779, a mais antiga fonte de referência relativa ao transplante da cana-de-açúcar pelos judeus para as terras do Brasil. Dom Antônio de Capmany de Montpalau, membro da Academia Real de História e Letras de Sevilha, escrevia a respeito do açúcar:...” Este último produto, originário da Ásia, só era usado como remédio até a época da sua introdução e cultivo na América, para onde o levaram, da ilha de madeira, por alguns judeus proscritos de Portugal.”

De 1503 a 1530 milhares de “cristãos-novos” vieram para o Brasil auxiliar na colonização. Mas, a alegria do descobrimento não durou muito, pois em 1531, Portugal obteve de Roma a indicação de um Inquisidor Oficial para o Reino, e em 1540, Lisboa promulgou seu primeiro Auto-de-fé. Daí em diante o Brasil passou a ser terra de exílio, para onde eram transportados todos os réus de crimes comuns, bem como judaizantes, ou seja, aqueles que se diziam aparentemente cristãos-novos, porém, continuavam em secreto a professar a fé judaica. (cripto-judeus).  De uma simples terra de exílio a situação evoluiu e o Brasil passou a ser visto como colônia. Em 1591 um oficial da Inquisição era designado para a Bahia, então capital do Brasil. Não demorou muito, já em 1624, a Santa Inquisição de Lisboa processava pela primeira vez contra 25 judeus brasileiros (os nomes abaixo foram extraídos dos arquivos da Inquisição da Torre do Tombo, em Lisboa).

Os nomes dos judaizantes e os números dos seus respectivos dossiês foram extraídos do Livro: “Os Judeus no Brasil Colonial” de Arnold Wiznitzer – página 35 – Pioneira Editora da Universidade de São Paulo, gostaria apenas de citar alguns nomes destes judeus brasileiros que foram processados, julgados e condenados:
LISTA DOS PRIMEIROS 25 JUDEUS BRASILEIROS PROCESSADOS PELA CORTE PORTUGUESA
(As minutas dos processos da Santa Inquisição em Lisboa contra vinte e cinco judaizantes brasileiros processados antes de 1624, foram muito bem conservadas (e são bem legíveis) nos arquivos da Inquisição - Torre de Tombo - Lisboa);
              NOMES                       DOSSIÊS
·        Alcoforada, Ana                     (1166)
·        Antunes, Heitor                     (4309)
·        Antunes, Beatriz                   (1276)
·        Costa, Ana da                      (11116)
·        Costa, Brites da                   (11116)
·        Dias, Manoel Espinosa         (3508)
·         Duarte, Paula                      (3299)
·        Gonçalves, Diogo Laso          (1273)
·        Favella, Catarina                   (2304)
·        Fernandes, Beatriz                (4580)
·        Fontes, Diogo                       (3299)
·        Franco, Lopez Matheus         (3504)
·        Lopez, Diogo                        (4503)
·        Lopez, Guiomar                    (1273)
·        Maia, Salvador da                 (3216)
·        Mendes, Henrique                 (4305)
·        Miranda, Antônio Felix de      (5002)
·        Nunes, João                         (12464)
·        Rois, Ana                             (12142)
·        Souza, João Pereira de         (16902)
·        Souza, Beatriz de                 (4273)
·        Teixeira, Bento                   (5206)
·        Teixeira, Diogo                   (57204)
·        Ulhoa, André Lopes              (5391) 
Todos esses judeus brasileiros, cujos sobrenomes estão citados acima, foram julgados e condenados pela Inquisição de Lisboa, sendo que alguns foram deportados para Portugal e queimados, como por exemplo o judeu Antônio Felix de Miranda, que foi o primeiro judeu a ser deportado do Brasil Colônia. Outros foram condenados a cárcere e hábito perpétuo.
(É importante ressaltar que não podemos afirmar que todo brasileiro, cujo sobrenome constante desta lista acima seja necessariamente descendente direto de judeus portugueses).
Quando os judeus aqui chegavam, desembarcavam na maioria das vezes na Bahia, por ser naquela época o principal porto. Acompanhando a história dessas famílias, nota-se que grande parte delas se dirigia em direção ao norte como Pernambuco e outros estados do nordeste. No início do domínio holandês no nordeste no século XVII, muitos judeus portugueses que haviam ido para Holanda vieram para o nordeste brasileiro. E com o término  do domínio holandês muitos destes judeus vieram para o sul, principalmente, para Minas Gerais, atraídos pelo ciclo do ouro e das pedras preciosas. Outra boa parte foi para América do Norte, estabelecendo lá cidades como a Nova-Amsterdam, mais tarde conhecida como Nova York. Outra pequena parte voltou para Holanda. Esses estados foram bastante influenciados por uma série de costumes judaicos, que numa outra oportunidade gostaríamos de abordar. Mas, falando um pouquinho do jeito mineiro, aquele indivíduo moreno-claro, cabelos negros, de baixa estatura, testa curta, cara alongada e nariz pontiagudo, destacando a habilidade no comércio, ganancioso por um bom negócio, além do estereótipo sorrateiro, desconfiado, trabalhando calado e na sua crença, tendo o apelido de “pão duro”, são exemplos de algumas características até hoje povo hebreu.
Agora, o que pouca gente sabe é que a Inquisição tanto em Portugal como no Brasil durou mais de 3 séculos, ou seja, o maior período se comparado com outros países. O término desta perseguição ocorreu oficialmente no dia 31 de março de 1821. Mas, sabemos que até nos dias de hoje encontram-se resquícios desta rejeição. 
(*) Marcelo Miranda Guimaraes – Engenheiro Industrial, MBA em Finanças, Teólogo – Fundador da Abradjin ( Associação Brasileira dos Descendentes de Judeus da Inquisição) e do CCMS- Centro de Cultura e Memória Sefaradita em Belo Horizonte-MG
 

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© Copyright 2002 ARTISTS FOR ISRAEL INTERNATIONAL. All rights reserved. abaddon (destruction) abirei lev (stubborn of heart) ach ahuv (a beloved brother [in Moshiach]) ach'av mashtin b'kir (him that urinates against the wall, i.e. all males) Ach'av (Ahab, King Ahab of Israel) ach (brother) achad asar (Eleven, the Eleven) achai (my brethren) acharei (after) acharim (end-times things) acharit hashanim (future years) acharit hayamim (last days, [Messianic] latter days) acharit shanah (end of the year) acharit yam (the extreme end of the sea) acharit (future, end, last, final outcome, latter end, i.e., future destruction) acharon (afterward, in the future, last) acharonim (last ones) achavah (brotherhood) achayot, akhayot (sisters) Achazyahu (Ahaziah of Judah) achdus (union, unity) achdut of yichudim (unity/ harmony of unifications) achdut (unity) achei Yosef asarah (Yosef's ten brothers) achei Yosef(the brothers of Yosef) acheicha (thy brethren) acheinu (our

Gematria - Tabela

PÁGINA PRINCIPAL                         TOC  para trabalhos em Desenvolvimento Hebrew Gematria por Bill Heidrick Copyright © por Bill Heidrick Instruções:  Para ir para entradas em um valor particular, selecione o link sobre esse valor. Blanks onde os números seriam indicam há entradas ainda para esse número. Um fundo escuro indica que as entradas são apenas referals para palavras e frases usando valores finais em letras. Intro 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 55 56 57 58 59 60 61 62 63 64 65 66 67 68 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 100 101 102 103 104 105 106 107 108 109 110 111 112 113 114 115 116 117 118 119 120 121 122 123 124 125 126 127 128 129 130 131 132 133 134 135 136 137 138 139 140 141 142 143 144 145 146 147 148 149 150 151 152 153 154 155 156 157 158 159 160 161 162

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Muitos Brasileiros são Descendentes de Judeus Você sabia que muitos Brasileiros são Descendentes de Judeus?   Por Marcelo M. Guimarães    Um povo para ser destacado dentre as nações precisa conhecer sua identidade, buscando profundamente suas raízes. Os povos formadores do tronco racial do Brasil são perfeitamente conhecidos, como: o índio, o negro e o branco, destacando o elemento português, nosso colonizador. Mas, quem foram estes brancos portugueses? Pôr que eles vieram colonizar o Brasil ? Viriam eles atraídos só pelas riquezas e Maravilhas da terra Pau-Brasil ? A grande verdade é que muitos historiadores do Brasil colonial ocultaram uma casta étnica que havia em Portugal denominada por cristãos-novos, ou seja, os Judeus ! Pôr que ?   (responder esta pergunta poderia ser objeto de um outro artigo).  Em 1499, já quase não havia mais judeus em Portugal, pois estes agora tinham uma outra denominação: eram os cristãos-novos. Eles eram proibidos de deixar o país, a fim